A FUNÇÃO DA AUDITORIA OPERACIONAL NA AVALIAÇÃO E

NO CONTROLE DE ENTIDADES GOVERNAMENTAIS

(Artigo publicado*)

Prof. Ms. Arlindo Carvalho Rocha

 

I. INTRODUÇÃO

O crescente interesse despertado atualmente em torno da Auditoria Operacional deve-se, sobretudo, à necessidade de aprofundar-se a discussão do assunto, mormente após as atribuições delegadas ao Controle Externo pela Constituição Federal.

Esse interesse, no entanto, tem-se deparado permanentemente com a escassez de literatura sobre o tema. Daí a decisão de escrever este artigo que constitui, tão somente, um referencial introdutório, objetivando mostrar a importância da auditoria operacional no controle e avaliação das entidades governamentais.

Desenvolvemos o tema nos quatro tópicos seguintes, destacando, inicialmente, a oficialização da auditoria operacional, ao nível do Controle Externo, por dispositivo constitucional, mostrando ainda, a crescente necessidade da avaliação e do controle permanente das entidades governamentais, além de conceituar auditoria operacional.

Na seqüência, enfocamos a auditoria operacional em relação às empresas estatais, por tratar-se de segmento importante e muito visado entre as entidades governamentais, destacando alguns aspectos que nos parecem importantes para, em seguida, concluirmos ressaltando as perspectivas futuras da auditoria operacional no Brasil.

 

II.     AUDITORIA OPERACIONAL

II.1   A Auditoria Operacional e a Constituição

Com a promulgação da Constituição Federal, em 05 de outubro de 1988, o Controle Externo, exercido pelo Poder Legislativo com o auxílio do Tribunal de Contas da União, incorporou, por força do "caput" do artigo 70 da Carta Magna, poderes para exercer a "fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas" (grifo nosso).

O Tribunal de Contas da União, por sua vez, passou a contar com a competência constitucional de realizar, por iniciativa própria, "... inspeções e auditorias de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, nas unidades administrativas dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, ..." (grifamos - art. 71, inciso IV), aí incluídas as fundações e as sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público Federal, nos termos do inciso II do citado art. 71.

Assim, o Controle Externo, e em particular o Tribunal de Contas da União, tiveram o seu poder fiscalizador, e conseqüentemente suas responsabilidades, significativamente ampliadas a partir da institucionalização da auditoria operacional, ao mesmo tempo em que viram consolidado seu universo de atuação.

As razões que levaram a Assembléia Nacional Constituinte a ampliar e consolidar as competências constitucionais do Controle Externo são amplamente conhecidas e foram respaldadas na necessidade de se atender, de forma mais completa e abrangente, a crescente demanda da sociedade por informações qualificadas quanto ao desempenho das atividades do Setor Público.

 

II.2   A Necessidade do Controle e da Avaliação nas Entidades Governa­mentais

Há concordância entre os autores que o propósito de uma auditoria é informar. Ao se auditar uma entidade pública, basicamente se está buscando informações sobre as suas atividades para que se possa, por um lado, cumprir os preceitos legais que determinam o julgamento sistemático das contas de seus administradores e, por outro, informar ao próprio governo e à sociedade, sobre essas entidades.

Além do aspecto legal, portanto, a necessidade do controle e da permanente avaliação do desempenho das entidades governamentais estão também, e principalmente, vinculadas ao aspecto ético-moral de responder à sociedade pelo bom emprego dos recursos destinados a essas entidades, pois um dos princípios fundamentais das sociedades democráticas é o de que o Poder Público tem a obrigação de prestar contas de suas ações, não só explicitando os objetivos e programas contemplados com recursos públicos, como também a forma como tais recursos foram empregados e os resultados obtidos.

Assim, para atender à determinação legal claramente colocada na Constituição, mas também para atender ao aspecto ético-moral exigido pela sociedade, o Controle Externo vê-se compelido, e autorizado, a estender os seus controles e avaliações a níveis de profundidade e abrangência bastante mais amplos que os até então praticados.

Em contrapartida, cresce igualmente a necessidade de se utilizar instrumentos adequados para que o Controle Externo possa responder a essas exigências, e a auditoria operacional é, sem dúvida, um dos instrumentos mais adequados para esse fim.

 

II.3   O Conceito de Auditoria Operacional

Auditoria gerencial, auditoria de programas, auditoria de resultados, auditoria interna moderna, são alguns exemplos da variada terminologia utilizada para designar o que convencionamos chamar de auditoria operacional.

A exemplo das variadas designações, vários são, também, os conceitos de auditoria operacional. Lawrence B. Sayer definiu-a afirmando que ela consiste em fazer o que o presidente da Empresa faria se tivesse tempo e soubesse como fazê-lo (OLACIF, 1981, p. 9).

Já Franklin C. Pinkelman, adaptando essa mesma definição às peculiaridades da auditoria governamental, disse que a Auditoria Operacional Governamental é simplesmente fazer o que os governantes, parlamentares ou titulares de entidades governamentais fariam se tivessem tempo e soubessem como fazê-lo (op. cit., p. 65).

Muitas outras definições foram formuladas:

- a avaliação do rendimento de uma entidade;

- uma atividade interessada no exame e na evolução gerencial e seus controles operacionais;

- uma evolução dos sistemas gerenciais em operação;

- uma avaliação construtiva das alternativas futuras disponíveis para uma organização.

O conceito que mais se aproxima do que se pretende deva ser uma auditoria operacional, dentro do enfoque do Controle Externo, entretanto, é aquele que concebe a Auditoria Operacional como uma avaliação da eficácia de uma entidade em cumprir seus objetivos, programas e metas, e da legalidade, economicidade e eficiência na administração de seus recursos.

A dificuldade desse conceito, porém, está em entender qual o significado exato dos termos eficácia, eficiência e economicidade nela empregados.

Uma vez compreendidos esses termos, no entanto, estaremos aptos a assimilar o alcance e a profundidade pretendidos, bem como as dificuldades e a complexidade relacionadas à execução de auditorias operacionais.

Assim, a perfeita compreensão do significado da auditoria operacional depende, em grande parte, da conceituação clara dos termos que lhes são próprios.

 

II.4   Os três "E" da Auditoria Operacional

Os termos economicidade (ou economia), eficiência e eficácia, embora de aceitação geral e de contarem com uma relativa unanimidade quanto aos seus significados, devem ter, em relação à auditoria operacional, definições bastante precisas que permitam não só a perfeita assimilação desse tipo de auditoria, conforme já ressaltado anteriormente, mas também que evitem o surgimento de quaisquer dúvidas conceituais.

Assim a economicidade pressupõe a obtenção e utilização adequadas dos recursos humanos, materiais e financeiros, os quais devem estar disponíveis nas quantidades necessárias e suficientes e no momento adequado.

A eficiência, por sua vez, pressupõe a obtenção de níveis máximos de produção com o mínimo de recursos possíveis. Pressupõe, portanto, obter-se a máxima produtividade dos recursos disponíveis.

A eficácia, finalmente, pressupõe que os resultados obtidos estejam dentro dos objetivos propostos para a entidade. Significa dizer que, em uma entidade pública eficaz, os resultados produzidos pela sua atuação são aqueles para os quais ela foi criada (ou direcionada), e constantes da legislação própria, e cujos produtos ou serviços estejam dentro de padrões de quantidade e qualidade consentâneos.

Desse modo, pode-se afirmar que, em resumo, o que se busca saber a partir de uma auditoria operacional é se a entidade auditada vem obtendo os resultados desejados, ao menor custo possível.

 

III.    O QUE É A AUDITORIA OPERACIONAL

III.1  Auditoria Tradicional Vs. Operacional

Não se pode afirmar que as atividades que hoje são vistas como próprias da auditoria operacional sejam novas. Nova é a necessidade que se apresenta atualmente, em vista do crescimento físico e da complexidade das organizações e a evolução das técnicas de administração, de buscar-se uma sistematização do estudo das ações que envolvem esse tipo de auditoria, dando, por conseguinte, maior consistência ao trabalho dos auditores.

Sobre esse aspecto, Aaron Schineider apresenta-nos um exemplo bastante significativo, retirado de um manual de auditoria de uma empresa. Diz o referido manual:

 

“Os auditores deverão determinar se as leis, os contratos, as políticas e procedimentos estão sendo seguidas apropriadamente e se todas as transações comerciais foram realizadas de acordo com as políticas estabelecidas e com êxito. Em relação a isso, os auditores devem formular sugestões para melhorar os procedimentos e serviços existentes, críticas aos contratos com sugestões para melhora-los, etc.” (in ILACIF, 1981, p. 30).

 

O manual em questão é da empresa alemã KRUPP, fabricante de armamentos, e o texto transcrito data de 1875.

Assim, embora as atividades inerentes à auditoria operacional não sejam novas, o seu estudo e sistematização o são. E, para que possamos melhor compreender o que é e quais os seus propósitos, o caminho mais indicado, parece-nos, será compará-la à auditoria tradicional ou auditoria financeira.

Preliminarmente, cabe ressaltar que a auditoria operacional é uma evolução natural da auditoria tradicional, que deixou de ser especificamente contábil para tornar-se abrangente, acrescentando à verificação da legalidade e correção dos registros contábeis, a determinação da economicidade e eficácia das entidades.

Metodologicamente, não existem diferenças significativas em relação à realização de uma auditoria financeira e uma auditoria operacional. Essas diferenças aparecem, no entanto, quando analisamos a abrangência e os objetivos pretendidos em cada uma delas.

Genericamente, qualquer auditoria (operacional ou financeira) caracteriza-se pela realização de verificações e análises, objetivas e sistemáticas, das operações de uma determinada entidade, cujos resultados serão posteriormente consubstanciados em um relatório.

A diferença básica entre a auditoria financeira e a operacional está, como já salientado, na abrangência e nos objetivos pretendidos.

Márcio Villas, Diretor de Auditoria da Trevisan e Associados, ao tratar desse aspecto em recente artigo, afirmou:

 

“Enquanto, na primeira, o objetivo está relacionado com a adequação das demonstrações financeiras, na segunda as demonstrações financeiras servem apenas como instrumento do seu processo, visto que seu objetivo está vinculado à apreciação das operações ou atividades de uma entidade segundo os benefícios por ela produzidos”. (Villas, 1989, p. 3).

 

Objetivamente, uma auditoria tradicional busca:

• analisar as transações, contas, relatórios e balanços de um dado período;

• verificar o cumprimento das disposições legais e normas regulamentadoras;

• verificar os sistemas internos de controle financeiro.

A auditoria operacional, além desses, pretende:

• analisar o planejamento, a organização e os sistemas internos de controle administrativo;

• avaliar a eficiência e a economicidade com que são utilizados os recursos humanos, materiais e financeiros;

• avaliar o resultado das operações realizadas em relação aos objetivos pretendidos.

Assim, enquanto a auditoria financeira limita a sua abrangência à área contábil-financeira, a auditoria operacional estende-se por toda a organização. Enquanto a primeira objetiva, principalmente, verificar, a segunda pretende, também, avaliar.

Por outro lado, deve ficar claro que a auditoria operacional não é, e nem poderia ser, a sucedânea da auditoria financeira, e sim a sua complementação. Na verdade, a auditoria operacional é, de fato, uma etapa posterior à auditoria financeira, de tal forma que, atualmente, as auditorias de amplo escopo, abrangendo em uma única ação a auditoria tradicional e a operacional, têm sido denominadas de Auditoria Integrada.

 

III.2  O Processo da Auditoria Operacional

Os procedimentos adotados em uma auditoria operacional guardam grande semelhança com os praticados nas auditorias tradicionais. Dois aspectos, no entanto, devem ser destacados dada a sua importância dentro da auditoria operacional. O planejamento (ou preparação) e o relatório, uma vez que o trabalho de campo, propriamente dito, pouco difere nos dois casos, e as regras e condutas são aplicáveis a ambas.

O primeiro aspecto leva em conta que os resultados de uma auditoria estão diretamente relacionados com a sua preparação. Quanto mais bem planejada, melhores serão seus resultados. A auditoria operacional não é diferente. Ao contrário, o planejamento de uma auditoria operacional é fundamental para a obtenção de resultados significativos. Numa boa ou má preparação reside o seu êxito ou o seu insucesso.

É, portanto, na fase do planejamento que se deve obter uma visão geral da entidade a ser auditada; conhecer seus objetivos e propósitos, buscar informações relevantes em relação aos aspectos (ou setores) a serem visitados, bem como definir os dados que servirão de paradigma para as avaliações. É nessa fase, também, que devem ser determinados os critérios que serão empregados quando da execução do trabalho de campo, levando-se em conta eventuais evidências anteriormente detectadas, definindo-se a abrangência e a profundidade das análises e a dimensão e qualidade das verificações, bem como deve-se estabelecer, ainda, os parâmetros e o escopo dos resultados pretendidos. É, pois, fundamental uma boa preparação para o êxito de uma auditoria operacional, pois conforme nos lembra John Cook, “Quando devidamente planejados, os procedimentos de auditoria possibilitam ao auditor inspecionar a evidência que maior grau de relevância apresenta para o parecer.” (Cook e Winkle, 1981, p. 30).

Quanto à elaboração do relatório, cabe destacar, preliminarmente, o que D. L. Scantlebury, em seu artigo denominado “A Estrutura de um Relatório de Auditoria Operacional”, recorda:

 

“Assim como cada edifício, sem interessar quão diferente seja dos outros, tem características básicas, tais como: teto, paredes, piso e outras, cada relatório de auditoria operacional tem certos elementos estruturais comuns que podem ser considerados como os elementos primários, à base dos quais é possível desenvolver completamente um relatório de auditoria.” (in ILACIF, 1981, p. 101).

 

O que diferencia, no entanto, um relatório de auditoria operacional dos outros, são as características da suas conclusões. Embora estruturalmente semelhantes, as conclusões inferidas de uma auditoria operacional apresentam um grau de complexidade muito maior, pois deixam o campo específico das Ciências Contábeis para enveredar pela Economia, pela Administração, pelas Engenharias, etc. Tornando-se, dessa forma, multidisciplinar.

Essa abrangência requer do auditor, em contrapartida, uma maior disciplina e um maior rigor na elaboração do seu relatório, principalmente em se tratando de entidades governamentais, onde poderão estar em jogo, muitas vezes, decisões sobre extinções, transferências, privatizações, alterações jurídicas e outras tantas, sendo, portanto, fundamental que ao apresentar suas conclusões e recomendações, estas sejam expostas clara e objetivamente e sempre embasadas em estudos e opiniões técnicas, pois como bem salienta Márcio Villas:

 

“Muitas vezes, já temos convicções técnicas, políticas e ideológicas que não são, por si só, universalmente aceitas como verdades absolutas. Por essa razão, nas suas conclusões a respeito da auditoria operacional realizada e, conseqüentemente, na elaboração do correspondente relatório o auditor não deve, nem tem direito de se deixar influenciar por essas convicções.” (Villas, 1989, p. 19).

 

Como se pode ver, embora semelhantes, a realização de uma auditoria operacional requer cuidados adicionais em relação à tradicional, pois sua elaboração envolve conhecimentos multidisciplinares e clareza de objetivos. Exige, ademais, disciplina e pertinácia do auditor, que não pode permitir que preconceitos e opiniões afetem a imparcialidade e a impessoalidade necessárias à interpretação dos dados e informações recolhidas, as quais, por fim, devem ser registradas de forma clara e objetiva.

 

IV.    A AUDITORIA OPERACIONAL E AS EMPRESAS ESTATAIS

As empresas estatais constituem-se em importante segmento dentre as entidades governamentais e estão, permanentemente, sendo objeto de discussões e análises, quer por parte do Poder Público, quer por parte da sociedade em geral.

Tais discussões e análises, no entanto, demandam, cada vez mais, a elaboração de informações apropriadas que lhe possam dar embasamento. Nesse sentido, a auditoria operacional assume especial importância como uma fonte de obtenção dessas informações.

Por esse motivo, alguns comentários devem ser feitos em relação à auditoria operacional em empresas estatais.

 

IV.1  A Necessidade de Informações

Não é incomum vermos empresas estatais serem auditadas, tendo suas contas certificadas e julgadas regulares, enquanto se discute, e se afirma, que aquela empresa é desnecessária, que não cumpre as suas finalidades ou que não atua da forma que seria desejável. Mas quem tem razão? Os auditores que certificaram a regularidade das suas operações ou a sociedade que apregoa a sua ineficiência?

De certa forma, todos têm razão. Uma auditoria financeira, ao examinar as transações, contas, balanço e a legalidade dos atos praticados em determinada empresa, pode chegar à conclusão que tudo está perfeitamente de acordo com as normas legais e com os princípios contábeis geralmente aceitos, e portanto, certificar a perfeita regularidade das contas, sem, contudo, ter condições efetivas de avaliar se os recursos públicos postos à disposição dessas empresas estão sendo utilizados em atividades realmente necessárias, em operações eficazes, etc.

De fato, uma auditoria financeira bem feita propicia, apenas, parte das informações necessárias, embora importantes e indispensáveis, que permitem responder às questões acima. As informações complementares só serão obtidas em uma auditoria operacional.

Muito embora reconheçamos que as empresas possuam no lucro um importante fator diferenciador em relação às demais entidades de governo, sua obtenção não significa, a priori, que a sua atuação seja eficiente e eficaz, principalmente levando-se em conta a conformação da economia brasileira, onde os monopólios, oligopólios e cartéis são uma constante e onde tarifas e preços públicos controlados não refletem, via de regra, os custos de produção.

Não se pode esquecer, ainda, que essas entidades, embora empresas, são também estatais e que, portanto, além do comportamento meramente econômico, representado pela relação custo/lucro, incorporam um outro componente, eventualmente mais importante que o econômico, representado pela relação custo social/benefício social. Este último reforça, ainda mais, o aspecto ético-moral da necessidade permanente de controle e avaliação das empresas estatais para que estas desempenhem, de fato, o seu papel social.

Por fim, há que se destacar que, além dos aspectos legal e ético-moral de responder à sociedade pelo bom emprego dos recursos públicos, existe ainda um motivo acessório, embora não menos importante, para se obter mais e melhores informações: é a necessidade do Poder Público de conhecer o seu próprio desempenho para poder planejar e demarcar a sua atuação.

 

IV.2. Outros Aspectos da Auditoria Operacional em Empresas Estatais

Segundo Elmer B. Staats (ILACIF, 1981, págs. 83/90), uma auditoria operacional para atender às necessidades de informações de todos os usuários interessados (controle externo, governo, sociedade e os próprios auditados) deve possuir três componentes (ou níveis segundo entende Pinkelman - op. cit. p. 68), que classificaremos como sendo os níveis de exigência mínima, de rendimento e de resultados.

O nível de exigência mínima contempla o exame das transações financeiras, dos controles e do cumprimento da legislação. Caracteriza-se por considerar se:

• as operações financeiras são conduzidas adequadamente?

• as informações financeiras (e a própria empresa) se apresentam adequadamente?

• a empresa está cumprindo a legislação e a regulamentação vigentes?

• os registros das operações realizadas são adequados?

O nível de rendimento ocupa-se da determinação da economicidade e eficiência na utilização dos recursos alocados à empresa. Caracteriza-se por considerar, entre outros, se:

• os recursos utilizados estão disponíveis no momento, na quantidade e na qualidade necessárias e suficientes?

• foram detectadas práticas ou ações ineficientes e antieconômicas?

Finalmente, o nível de resultados ocupa-se da avaliação do desempenho da empresa em vista dos seus resultados operacionais vis-à-vis os objetivos (econômicos e sociais) que lhe são atribuídos. Caracteriza-se por considerar, basicamente, se:

• a empresa está cumprindo os objetivos estabelecidos?

• a empresa tem considerado outras alternativas que lhe permitam atingir os mesmos resultados com um custo menor?

• a empresa tem obtido ganhos de produtividade com a criação ou incorporação de novas tecnologias?

Essa estratificação, em níveis, demonstra claramente a complexidade e a abrangência de uma auditoria operacional, principalmente ao considerarmos a quantidade de empresas estatais brasileiras, ante o porte, a diversidade, a complexidade e a tipicidade dessas empresas.

Por outro lado, para que se possa encaminhar com seriedade um programa de auditorias operacionais nas empresas estatais brasileiras, deve-se levar em conta todos esses fatores,

Exemplo típico das dificuldades a serem superadas na realização de auditorias operacionais em empresas estatais brasileiras é propiciado pela forma de organização do mercado em nosso país, Essa organização determina formas de atuação dessas empresas estatais absolutamente diversas entre si, pois enquanto existem empresas atuando em setores tipicamente monopolistas, como a Petrobrás e a Eletrobrás, e portanto sem sofrerem concorrência, outras atuam em setores de grande competitividade e altíssima tecnologia, como é o caso da Embraer.

Tal diversidade acaba por constituir-se em fator de dificuldade quando do estabelecimento de uma metodologia de trabalho para a auditoria operacional que seja comum a todo esse universo.

A obtenção de dados que sirvam de paradigma para avaliação ao nível de resultados em empresas monopolistas, por exemplo, demanda não só a necessidade de comparação com empresas no exterior, o que, por si só, já dificulta o trabalho, mas, além disso, requer a necessária uniformização de todos os dados obtidos a fim de que se tornem realmente comparáveis, sem gerar distorções. Este é o caso também das empresas que, embora não sendo monopolistas de mercado, dado inexistirem restrições maiores à fabricação ou importação de produtos similares, não possuem concorrentes do mesmo porte instaladas no país,

Já em empresas sem monopólio e com similares instaladas no país, a obtenção dos dados torna-se mais simples e menos trabalhosa, o que contribui para minorar a possibilidade de erros de avaliação.

De qualquer forma, embora com dificuldades a superar, não se deve esquecer que a implantação progressiva da auditoria operacional nas empresas estatais, nos três níveis de controle - externo, interno (supervisão ministerial) e das auditorias internas das próprias empresas - trará, certamente, grandes benefícios, não só do ponto de vista da transparência das ações do Estado, quanto da própria agilização e objetividade na gerência dessas empresas, quer pelo próprio governo, quer por suas administrações específicas.

 

V.     A EXPERIÉNCIA INTERNACIONAL

No seminário “Auditoria Operacional no Setor Público: Ferramenta Dinâmica para o Desenvolvimento”, promovido pelo Instituto Latinoamericano de Ciências Fiscalizadoras - ILACIF, o Controlador do Estado de Israel, I. E. Nebenzahi, após descrever uma série de auditorias operacionais levadas a efeito pela controladoria em entidades governamentais, afirmou:

 

“Os exemplos mencionados sobre a auditoria operacional em Israel são apenas um fragmento daqueles que podem ser examinados... De qualquer maneira, seu propósito consiste em mostrar que o rumo básico da auditoria operacional em Israel é igual ao de outras partes, vale dizer que o material a espera de auditoria é quantitativa e qualitativamente quase ilimitado.” (ILACI F, 1978, p. 12).

 

No mesmo seminário, o Auditor Geral da Suécia, G. Rune Berggren, referindo-se ao mesmo tema, declarou:

 

“Para dizer a verdade, estamos trabalhando com a suposição de que em uma perspectiva de tempo mais longa, a auditoria operacional chegará a predominar sobre a auditoria de efetividade na Suécia.” (ILACI F, 1978, p. 73).

 

Observe-se, entretanto, que a expressão “auditoria de efetividade”, no sentido usado pelo Auditor Geral, equivale ao segundo nível (de rendimento) definido anteriormente, e não apenas à auditoria financeira tradicional (primeiro nível).

Mais adiante, conclui o Auditor Geral:

 

“Em conclusão, me permito enfatizar o fato de que a auditoria de efetividade na Suécia está, todavia, em processo de desenvolvimento. Poderíamos perguntar se algum dia poderá ser diferente em um mundo caracterizado por mudanças rápidas e incessantes com respeito tanto aos valores como às estruturas." (op. cit. p. 82).

 

Muitos outros exemplos poderiam ser citados para demonstrar que esse é o rumo a ser seguido, daqui por diante, pelas entidades incumbidas das auditorias governamentais em todo o mundo.

 

VI.    CONCLUSÃ0

No Brasil, a auditoria operacional governamental ainda ensaia os seus primeiros passos na esteira da competência constitucional atribuída aos órgãos de controle.

O caminho a seguir é, sem dúvida, longo e difícil, na medida em que serão necessárias a decisão política de estabelecer as condições básicas e os instrumentos indispensáveis para que a realização dessas auditorias surtam os efeitos esperados, bem como a de formar uma massa crítica de profissionais devidamente capacitados a conduzi-las.

Quanto à decisão política, a própria inclusão da auditoria operacional no texto constitucional demonstra e sinaliza o que a sociedade espera dos órgãos de controle.

A capacitação técnica, por sua vez, só ocorrerá com o desencadeamento de um esforço concreto e permanente de treinamento e aperfeiçoamento, a partir do qual os profissionais envolvidos sintam-se motivados e sejam incentivados a desenvolver, com a seriedade e a profundidade necessárias a auditoria operacional.

Por fim, devemos observar que as transformações ocorridas no mundo mostram, claramente, que as mudanças não acontecem por acaso, e que embora, por vezes, os caminhos que levam a elas nos pareçam longos e os resultados inatingíveis, a vontade, a seriedade, a persistência, a convicção e a honestidade de propósitos, quando traduzidas em idéias claras e em um trabalho competente, têm o poder de encurtar distâncias e precipitar soluções.

Assim, podemos estar certos de que o desenvolvimento e a consolidação da auditoria operacional governamental, no Brasil, mais do que qualquer outro fator, depende, fundamentalmente, de nós, profissionais que atuamos no controle.

 

VI. BIBLIOGRAFIA

1. BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Centro Gráfico do Senado Federal, 1988, 292p.

2. COOK, John W. & Winkle, Gary M. Auditoria: filosofia e técnica. São Paulo, Ed. Saraiva, 1981, 1q ed. 2q tiragem, 451p.

3. ILACIF - Instituto Latinoamericano de Ciencias Fiscalizadoras. Auditoria Operacional. Bogotá, Ed. Dintel, 1981, 2ª ed. 538p.

4. __________ Manuel Latinoamericano de Auditoria Profesional en el Sector Publico. Bogotá, Ed. Dintel, 1981, 3q ed. 538p.

5. ___________ Auditoria Operacional en Israel, Perú y Suecia. Publicación 17, relativa ao seminário “Auditoria Operacional en el Sector Publico: Herramienta Dinámica para el Desarrollo.” Quito, 1978, 85p.

6. VILLAS, Marcio Martins. Auditoria Operacional em Entidades Governamentais. Brasília, Mimeografado, 1989, 31p.

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(*) Artigo publicado na Revista do Tribunal de Contas da União,  nº 44, abr/jun de 1990, p. 67/79. Brasília, março de 1992.

        

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