Momentos da
Verdade
(Artigo publicado*)
Prof. Ms. Arlindo Carvalho Rocha
Em 1982, aos 40
anos de idade, Jan Carlzon assumiu a presidência da Scandinavian
Airlines System - SAS, em meio a uma crise financeira da empresa que a havia
levado a acumular cerca de 30 milhões de dólares de prejuízo.
Três anos depois, em 1985, com a
companhia revigorada e lucrativa (inclusive tendo sido eleita, no ano anterior,
"a companhia aérea do ano" pela "Air Transport World"), Carlzon
resolveu contar num livro - Moments of Truth (CARLZON, Jan. A Hora da
Verdade - 10ª ed., Rio de Janeiro, Editora COP: 1994) - como foi possível
transformar a crise em sucesso, aplicando à SAS um conceito simples porém
inovador de fazer negócios: "centrar a atenção da empresa no cliente".
Embora escrito há mais de uma
década, seu texto é bastante atual, de leitura leve e envolvente e pontilhado
de fatos e histórias.
Centrado na sua experiência
cotidiana, Carlzon, além de fazer da narrativa um libelo a favor
da qualidade total em serviços e da filosofia da empresa voltada para o
cliente, trouxe à luz o conceito de "Qualidade em Serviços".
O autor baseia sua argumentação na
idéia de que as empresas devem centrar sua atenção no cliente, isto é, devem
ter como objetivo definidor de suas ações a plena satisfação dos seus clientes,
oferecendo-lhe aquilo que eles querem receber. A esse tipo o autor dá o nome de
"empresa voltada para o cliente" em oposição à empresa voltada
para o produto, na qual oferece-se sempre o melhor produto, porém nem sempre o
produto que o cliente realmente quer.
Segundo Carlzon,
nas empresas prestadoras de serviços cada vez que um funcionário atende a um
cliente, mesmo que esse contato se de por poucos instantes, está ocorrendo um
"momento da verdade", no qual o cliente está avaliando a empresa e
decidindo se mantêm-se fiel ou procura outra que lhe preste melhores serviços.
No texto o autor destaca,
basicamente, dois aspectos importantes para que uma empresa possa voltar-se
para o cliente: a) estabelecer objetivos estratégicos de longo prazo;
b) achatar a pirâmide de comando.
O estabelecimento dos objetivos
estratégicos de longo prazo segue o modelo do Planejamento Estratégico.
Começa por conhecer qual é, realmente, o negócio da empresa e em qual mercado
ele está inserido. Isto significa identificar claramente quem são os seus
clientes e quais os produtos que eles realmente querem e qual ou quais produtos
(que podem ser bens materiais ou serviços) a empresa está oferecendo no momento
e qual ou quais pretende oferecer no futuro. A partir desse conhecimento e
visando a oferta do novo produto, definem-se objetivos de longo prazo
(que devem ser poucos ou, se possível, apenas um único que englobe e sintetize
tudo o que se pretende) que sejam conhecidos e compreendidos por todos os
empregados. A seguir faz-se necessário estabelecerem-se as estratégias para a
empresa - que nada mais são do que as linhas mestras que a empresa deve seguir
dali em diante com vistas à consecução do(s) objetivo(s) estabelecido(s).
Finalmente, dentro de um processo de planejamento participativo, devem ser
estabelecidos os objetivos específicos para cada área de atuação da empresa
(serviços, departamentos etc.), bem como as respectivas metas, perfeitamente
definidas e quantificadas, a serem atingidas a curto e médio prazos.
Por outro lado, achatar a
pirâmide de comando consiste na reorganização da estrutura da empresa com o
objetivo de diminuir os níveis hierárquicos intermediários e delegar
responsabilidades e poder decisório para a linha de frente, isto é, para as
pessoas que estão em contato permanente com os clientes e que representam a
empresa na concepção desses clientes, pois, como sustenta o autor, são essas
pessoas que escutam e devem resolver os problemas dos clientes imediatamente,
sem entraves burocráticos ou de regulamento, e, para tanto, precisam ter poder
de decidir, serem responsáveis por suas próprias decisões e receberem apoio
material e institucional para as suas decisões.
Uma observação importante feita pelo
autor diz respeito aos níveis gerenciais (intermediários), que precisam ser
treinados e sensibilizados para os seus novos papeis. Esses gerentes devem ter
habilidade, inteligência e competência para instruir, treinar, informar,
criticar e elogiar a linha de frente e mobilizar os meios necessários para que
essa mesma linha de frente preste o serviço que dela se espera e atinja os seus
e os objetivos da empresa.
Da mesma forma, a alta administração
deve ser capaz de estabelecer os objetivos e as estratégias e agir como
verdadeiros líderes modernos, motivando, apoiando e delegando as decisões
operacionais para pessoal da linha de frente.
Cabe enfatizar, por fim, o grande
ensinamento que se extrai da narrativa de Carlzon (o qual, aliás, é
corroborado pelos mais importantes autores da área de Administração e Marketing
atuais) de que, daqui para frente, só sobreviverão no mercado altamente
competitivo de hoje aqueles que, além de oferecerem produtos e serviços de
qualidade, o façam em total sintonia e harmonia com as necessidades e
preferências dos clientes. E não só as empresas privadas mas, e principalmente,
as entidades públicas, tradicionais prestadoras de serviços de interesse
social, deverão estar atentas às necessidades de seus clientes, sob pena de
serem sumariamente descartadas pela sociedade como ineficientes e inúteis.
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(*) Artigo publicado no Informativo "União", de
24/08/98, do Tribunal de Contas da União. Brasília, agosto de 1998.